Nada se equipara a viajar, ver e sentir diferentes culturas. Olhar sempre para o Atlântico me fez uma pessoa observadora; atravessá-lo com frequência me fez uma pessoa melhor.
Olhar o horizonte desperta a transcendência que há em nós. O que transcende, a palavra não alcança. Viajar nos educa a transcender, condição necessária para evoluir e indispensável para lidar e liderar.
Liderar é motivar as pessoas para construir um futuro. Não conseguimos ver o futuro a não ser pela transcendência. A palavra tenta capturar a visão de futuro, mas é difícil.
Há mais de quarenta anos, deformei-me primeiramente em engenharia. No currículo, não havia disciplinas essenciais para que pudéssemos evoluir. Acabara a educação, essencial para a vida e imperava a racionalidade física e matemática. No curso, não havia sido ensinado a criar e manter relações de qualidade, a entender o alcance e a limitação das palavras, a importância da boa comunicação e tampouco o que poderia sugerir a semântica no entorno da transcendência. Saímos engenheiros diplomados, mas quase analfabetos para lidar e liderar uma organização.
Tive muita sorte: ao me formar, havia naquele tempo, um Grupo de Extensão Cultural do Estado da Guanabara (GECEEG). Todos os formandos em engenharia mecânica podiam se inscrever para viajar para a Europa e conhecer indústrias importantes na Inglaterra, Alemanha e Suíça.
Assim, em janeiro de 1979, um pequeno grupo de quinze jovens embarcaram para conhecer o velho mundo e suas indústrias. Essa viagem mudou a minha vida. Lembro-me dela até hoje em seus mínimos detalhes. Era difícil viajar naquele tempo. Para mim, atravessar o Atlântico era uma continuidade de tantas e tantas vezes que mirava o horizonte, imaginando o que poderia estar além dele. As palavras não ajudavam. Era como se a transcendência estivesse acontecendo.
Depois dessa viagem, jamais parei de viajar. Por toda parte do mundo, novos oceanos, novas culturas, mais imaginação e transcendência.
Essas viagens me ensinaram a evoluir, a ver a realidade com olhares estrangeiros e complementares.
Regra fundamental de um viajante: jamais julgue o que você encontrar. Apenas observe, observe e observe. Em algum momento, um insight lhe possibilitará compreender, com novos olhos, o que antes lhe parecia sem sentido. Uma pessoa com espessura existencial jamais julga qualquer cultura que encontra.
Deixei o Rio de janeiro para trabalhar no interior de São Paulo, de lá, para a Alemanha. Foram oito anos vivenciando novas culturas. Então, fui para Salvador para a primeira diretoria. Ao contrário de Gil, a Bahia me retirou a régua e o compasso. Deixava de ser engenheiro para virar um gestor. Fui para Bahia para conhecer o nordeste brasileiro, e jamais o deixei. Mantenho residência e negócios até hoje na região.
Há quase vinte anos retornei para a cidade de São Paulo, centro econômico de nosso país. Aprendi a gostar de cada lugar por ter aprendido a não os julgar, mas apenas aprender com culturas diferentes.
Neste momento, estou na sala de embarque prestes a atravessar o Atlântico mais uma vez. Tento manter a mesma curiosidade infantil dos meus olhares para o horizonte e a convicção de que a intuição precede a palavra e os sentidos. Sem eles, como trabalhar na evolução pessoal e, mais adiante, como liderar organizações. Como construir um futuro motivador sem a intuição transcendente que existe um propósito a ser cumprido?