Assim como aprendemos a escrever depois de aprendermos a falar, nossa espécie não foi diferente. Sem épocas precisas, começamos a transformar sons, grunhidos e gestos em fonemas reconhecíveis e a conferir-lhes significados algo como sessenta mil anos atrás e a escrever pouco mais de seis mil anos.
A palavra é a grande criação do Sapiens. A palavra escrita é o grande impulsionador do processo civilizatório que nós, humanos, experimentamos. A tecnologia iria cada vez mais multiplicar a palavra, o mundo da escrita e o mundo das imagens.
A palavra é o nosso maior patrimônio. Dominá-la é um grande diferencial entre nós.
Sempre que entrevisto um candidato a um posto de liderança, observo com atenção o domínio de seu próprio idioma. É possível perceber a qualidade de suas ideias e, pela concatenação de suas palavras, a capacidade de convencimento de seus pontos de vista. A cada dia, acredito, há menos espaço para aqueles que não dominam seu idioma, que não o tem como uma ferramenta para transmitir seu conteúdo, seu valor.
O verdadeiro teste seria uma prova escrita. Sim, uma prova escrita. Verificar como o indivíduo é capaz de utilizar seu texto, sua palavra escrita como forma de construir suas ideias, sua argumentação e seu poder de convencimento. Mas não faz parte de nossa cultura pedir que um candidato a um posto de liderança exponha seu conteúdo através de uma redação. Talvez um dia.
Recentemente, li a obra “O mundo da Escrita” de Martin Puchner, professor de literatura comparada na Universidade de Harvard. É uma obra que tenta compreender e interpretar a história do humano através da palavra escrita. Resumidamente, segundo ele, foi pela literatura que, por exemplo, Religiões e Estados atravessaram o tempo e deram forma ao que somos hoje. Os textos têm o poder de preservar o passado, provocar o presente e projetar o futuro.
A palavra é a estrela maior de nossa constelação civilizatória. Com ela a humanidade se alfabetizou, criou a ciência e trouxe o progresso. O primeiro bilhão de pessoas aconteceu no século XIX e um novo bilhão a cada 25 anos.
Para um líder, o domínio da palavra é essencial para uma efetiva comunicação. Seja em uma apresentação, em uma negociação ou em uma conversa franca e direta com sua equipe, o domínio da palavra é fator determinante para criar relações de qualidade e diferenciadas. Não devemos duvidar jamais da importância de saber usar as palavras.
A lógica funcionalista dos “textos do zap” substituindo a comunicação mais sensível, pessoal, romântica até, dos textos manuscritos com uma caligrafia caprichada não deveria diminuir nossa capacidade de compreender que a palavra deve ser também um tipo de arte. Não basta entregar um conteúdo, cabe usar a mensagem para despertar a reflexão e a sensibilidade.
A organização maquinal espremendo o indivíduo, pasteurizando a palavra, inibe a criatividade e não contribui para um ambiente inovador.
A leitura potencializa nossa curiosidade ancestral e a escrita nos permite articular nossa relação com o mundo de forma diferenciada.
Há quanto tempo você não escreve um texto que lhe dê orgulho por tê-lo produzido?
Não contamos mais histórias, estamos deixando de brincar com as palavras e abdicando aos poucos de nossa maior criação. Fale mais, leia mais e enriqueça suas relações.