Nas décadas de 1980 e de 1990, fui com frequência ao Japão, um país desprovido de riquezas naturais e que convive com toda sorte de furacões, tufões, terremotos e demais tipos de “mau humor da natureza”. Com o intuito de conhecer mais o dia a dia do japonês de Tóquio, tentava ir de metrô para os meus compromissos. Shinjuku era a estação mais perto do meu hotel e para lá, me dirigia pelas manhãs. Muita gente para entrar no metrô, um policial usando luvas brancas nos empurrava todos para dentro. Chamava-me atenção que quase todos os homens usavam ternos escuros e as mulheres também, quase uniformizadas, compunham um conjunto de vestimentas discretas e assemelhadas.
O Japão era um time (talvez ainda seja), onde ser igual é ser melhor. Dessa forma, apesar da natureza hostil, construíram uma nação educada, desenvolvida e unida. Uma experiência civilizatória para lá de interessante.
Essa realidade não é a nossa no ocidente. Nossa cultura valoriza mais o indivíduo, percebe a diferença como algo potencialmente mais valioso. Vestimo-nos com tons de cores diversos, alegres e nossos gestos nem sempre são contidos.
Ao nascermos, cada um é uma folha em branco. A educação dos pais – educando boas maneiras, como nos comportarmos e o que é certo ou errado – vai aos poucos nos tornando seres sociais mais assemelhados. Na escola, esse processo se intensifica até que, saindo da universidade, ganhamos um diploma de formatura em alguma coisa. Parece até que estamos prontos e acabados.
Uma das grandes diferenças entre a nossa cultura e a japonesa é a existência do que chamamos “sanção social”. Enquanto nossa sociedade é tolerante com a diferença (e cada dia mais), no Japão daquele tempo, a diferença é contida pela sanção da sociedade. É como se tivéssemos um mundo maior e mais poderoso do que as escolas tendem a nos apresentar. A diferença é um valor quase sempre apreciado (e potencialmente valioso) em nossa cultura e sofre menos com o conservadorismo dos valores vigentes.
Para evoluirmos, temos que ir muito além da educação formal que experimentamos quando jovens. A educação artística é tão ou mais valiosa do que cálculo infinitesimal. A curiosidade pelo novo, pelo que está distante e pelo mundo interior que habitamos são essenciais para nossa evolução e tudo isso quase sempre não faz parte de nossa educação. Às vezes, fico com a impressão de que aquilo que é essencial para evoluirmos como pessoa está fora da formação educacional que tende a nos colocar como mão de obra, quase como peças, para o funcionamento das organizações.
A grande metáfora, inspiradora das organizações, é a máquina que precisa de processos e pessoas (peças) para funcionar (vejam que a palavra “funcionar” não é utilizada à toa). Precisamos de uma educação que também nos desperte para a diferença. O caminho natural que vejo para tal é a compreensão e aplicação do conceito dialético para harmonizar o que parece antagônico. Repetir deveria ser tão necessário para o funcionamento das organizações quanto estimular a diferença para dar à luz inovações que impulsionam a evolução da humanidade.
Assim, performe sendo igual, tipo melhoria contínua (japonesa), mas igualmente semeie a diferença para criar o novo.
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Como sempre, o Murilo consegue extrair do que passa despercebido ou do que parece óbvio, reflexões que podem nos levar a ações. esta visão de time “uniformizado” tradicionalmente usados em escolas fundamentais, escoteiros, serviços militares, equipes esportivas e algumas empresas, geram identidade de propósito. Por outro lado, buscar algo inovador, cuja diferença de resultados pode se reverter em benefício da própria equipe, mas com a devida meritocracia, são posturas que se complementam, gerando crescimento para a sociedade, a organização e para o individuo. Parabéns, Murilo