Quando jovem, os problemas me consumiam; mais maduro, passei a administrá-los e a tentar transformá-los em oportunidades; hoje, me divirto com eles.
O século XX produziu uma série extensa de gurus sobre organização. Da estratégia a ser aplicada ao gerenciamento de processos mais produtivo, das discussões sobre a origem da motivação à categorização das lideranças, da reengenharia à inovação tecnológica, muitas das abordagens ajudaram a construir um senso comum de administração corporativa, em permanente expansão internacional, a ser replicado na prática como a coisa certa.
Alguns deles marcaram profundamente os líderes da minha geração. Aqui, destaco Alvin Toffler, futurista norte-americano que, desde a segunda metade dos anos 70, dedicou seus principais estudos ao que ele chamaria de “Infosfera”, “Psicosfera”, “Sociosfera” e “Tecnosfera”, antevendo o mundo www que começaria a existir, quase duas décadas depois, fora dos laboratórios. Toffler já discutia os efeitos dos paradoxos que a fragmentação psicossocial e a crescente globalização econômica causariam no século XXI. Muitas obras do gênero foram produzidas desde a publicação de “O choque do Futuro” e, sobretudo, “A Terceira Onda”, alargando e aprofundando o tema.
Acredito que a revolução tecnológica, na escala em que vivemos, tornou nossos gurus mais jovens, deixando as abordagens do século XX rapidamente para trás, substituindo professores-consultores por empreendedores mais fluentes no teclado do que em palestras. Porém, o desempenho tecnológico, no âmbito pessoal e organizacional, talvez não se sustente sem algumas das dimensões e abordagens “ultrapassadas” dos nossos gurus envelhecidos. Em sentido mais amplo, não custa lembrar que nossos primeiros gurus ocidentais caminham para os três mil anos e são objeto de estudos, proporcionalmente, cada vez mais restritos. Infelizmente.
Seria o fim dos gurus? Hoje, parece ser a vez de quem empreende mais do que de quem fala ou filosofa. A melhor administração está sendo feita agora em algum local, jamais em Havard. Hoje, talvez não precisemos mais da chancela acadêmica para reconhecê-la. Não há mais tempo para a intermediação. Antes, a Universidade ia ao fato, estudava o caso e replicava conceitos. Hoje, quando replica, já está ultrapassada.
Como manter importantes as dimensões (que não deixam de ser importantes) diante dos milhões de apps que se multiplicam? Queremos operacionalizar antes de compreender…
A incerteza, a pandemia ou a ruptura tecnológica não atingem os princípios e os propósitos de uma organização. As visões (e sua operacionalização) mudam rapidamente com o tempo, os valores e a cultura também mudam, mas seguem um outro ritmo.
Que a vida está repleta de contradições, surpresas, paradoxos e histórias, não temos dúvidas. Buscamos uma hermenêutica que responda (e nos pacifique) às questões essenciais. Por enquanto, nossa ferramenta mais potente continua sendo nossos sentidos, sentimentos e a evolução cognitiva. Trajetória de nossa espécie. Tecnologia é um capítulo apenas.
Gurus ainda são necessários para pensar e repensar nosso tempo e circunstâncias. Equilíbrio, o desafio permanente.
Autor: Murilo Sampaio
2 Comentários. Deixe novo
Excelente. As empresas passaram a ser plataformas e aplicativos, porém para administrar temos que recorrer aos “ultrpassados” Gurus.
Boa reflexão Murilo sobre os gurus . Será que os Gurus não foram “feitos para durar”?
Na Índia há uma máxima que o Guru somente surge quando o indivíduo está pronto. E para juntar paradoxo nisto, Guru significa: Gu- invisível e ru- visivel.
Ou seja, aquele que é tangível e não tangível ao mesmo tempo.
Apesar da dualidade intrínseca, os Gurus indianos, seguem, como mencionou, atravessando gerações!